O Econômico Belém. A Operadora de Caixa. O Patrão. O Assédio Sexual. O TST. A Condenação. A Indenização de R$ 50 Mil
A Terceira Turma do Tribunal Superior do Trabalho (TST) manteve a condenação do supermercado Econômico Comércio de Alimentos, de Belém , ao pagamento de indenização a operadora de caixa Carla Patrícia Flexa Ferreira, vítima de assédio sexual por seu chefe, de pré-nome Nildo. O caso envolveu condutas abusivas de um encarregado contra a operadora de caixa, que foi alvo de insinuações sexuais e comentários invasivos sobre seu corpo. Além disso, o agressor fez convites persistentes para encontros íntimos.
O ministro Mauricio Godinho Delgado, relator do recurso da empresa, entendeu que essas ações são definidas como assédio sexual e destacou o abuso de poder, já que a relação de subordinação aumentou a vulnerabilidade da funcionária às investidas do superior. O ministro enfatizou que o assédio sexual violou direitos fundamentais, como a honra, a privacidade e a dignidade da vítima. Godinho Delgado também ressaltou que a sociedade, ainda presa a padrões estereotipados, tende a dificultar a denúncia de casos de assédio e, muitas vezes, responsabiliza a própria vítima, subestimando a gravidade do problema.
O ministro relator reafirmou a necessidade de reparação integral pelos danos causados à operadora de caixa. A indenização, fixada em R$ 50 mil nas instâncias anteriores, foi mantida, por ser considerada proporcional à gravidade dos danos e adequada para punir a empresa, servindo também como exemplo para prevenir outros casos semelhantes. A decisão foi unânime. Veja abaixo alguns trechos da denúncia:
A reclamante alegou, em síntese: que desde que foi contratada pela empresa reclamada (2019) passou a receber recados do Sr. Nildo dizendo que este “era afim dela”, “que tinha interesse em sair com ela”, bem como mandou perguntar se a reclamante morava sozinha; que os recados eram entregues pelo embalador Artur e pela Sra. Raissa, operadora de caixa; que “sempre se manteve afastada do fiscal, pois ao levar tal situação ao conhecimento de seus gerentes foi aconselhada a ficar quieta, pois era de conhecimento de todos que o Sr. Nildo é companheiro da gerente da loja, a Sra. Glau; que também é de conhecimento de todos que é costumeiro naquela loja que o Sr. Nildo “da em cima” das empregadas; que quando a Sra. Glau (gerente) descobre dispensa a empregada”; que mesmo com as negativas, o sr. Nildo passou a lhe assediar de outras formas no local de trabalho, seja quando o fiscal tinha que fazer qualquer ajuste no seu caixa, sussurrando no seu ouvido, seja no intervalo intrajornada ou mesmo através de mensagens por aplicativo Whatsapp e redes sociais instagram e facebook;
que, ao denunciar o fato aos colegas, esses disseram para se calar para não perder o emprego, o que sempre ocorria com outras funcionárias por ele assediadas; que, em face a negativa dos convites dele para sair e do ciúme da gerente, foi perseguida e demitida; que, no momento que a Sra. Glau (gerente) tomou conhecimento do assédio, passou a espalhar que existia um caso do seu companheiro com a reclamante, iniciando diversos atos para amedrontá-la, inferiorizá-la e desmoralizá-la, desestabilizando-a, tanto que foi dispensada de cumprir o trabalho nas últimas duas últimas semanas do aviso; que a Sra. Glau usou seu cargo para punir a reclamante, tanto que ordenou a sua demissão, assim como fez com várias outras funcionárias que ela suspeitou de “ter um caso” com seu companheiro, o assediador;
que houve um consentimento velado por parte dos donos da empresa, que não tomaram qualquer providência para evitar e/ou reparar o crime cometido por seu funcionário; que, ao contrário, a atitude de ambos em não tomar uma atitude e permitir a propagação de boatos de que era a reclamante quem tinha um caso com o fiscal criou no ambiente de trabalho hostil, além da ideia de que ações dessa natureza são perfeitamente aceitáveis, já que era algo reiterado; pelo que pleiteou o pagamento de indenização por dano moral.
Em contestação, a reclamada pugnou pela improcedência do pedido, aduzindo que o Sr. Nildo exerce a função de conferente de carga, pelo que o mesmo não era o chefe imediato da reclamante e não dispunha de poderes próprios de figura de um empregador ou representante deste, portanto, não pode ser caracterizado como superior hierárquico, figura necessária para ser assediador sexual; que a única conversa de WhatsApp com o suposto assediador retrataria que não houve qualquer insistência por parte do Sr. Nildo para impor a sua vontade, mas sim, um ajuste consensual entre os envolvidos no diálogo; que, pelo teor das conversas, o que se vê é que não houve qualquer contato físico de natureza íntima do Sr. Nildo com a reclamante; que a própria autora, na inicial, declara que foi ela mesma que noticiou para a reclamada, já no curso do aviso prévio, o suposto assédio, e que, a seu pedido, cumpriu o restante do aviso prévio em sua residência; que a Gerente Glauebia não tem poder de decisão com relação à demissão de empregados, podendo, no máximo, sugerir a dispensa, pois essa atribuição é de competência do setor de RH juntamente com a direção da empresa; que, no mesmo dia em que a reclamante recebeu o aviso prévio, vários outros empregados e empregadas também receberam.
Compulsando os autos, verifica-se que foram anexadas conversas com outros funcionários da reclamada, nas quais é registrado que sabiam do comportamento constrangedor do Sr. Nildo, a exemplo do diálogo com os três números de celular constantes nos ids df9144d e seguintes.
a) O depoimento do Sr. Derik, em que declarou saber de outros casos de assédio por parte do Sr. Nildo, além do feito à autora; e ainda afirmou que viu mensagens de aplicativo da autora, nas quais o Sr. Nildo insinuava a marcação de encontros com a autora, o nudes das partes íntimas, e falava que queria, pelo menos, uma vez;
b) O depoimento do Sr. Inácio, em que afirmou que viu o Sr. Nildo passar a mão no corpo da reclamante; que sabia que o funcionário usava de seu cargo para assediar empregadas da reclamada, as quais até chegaram a pedir demissão por isso, bem como esclareceu que a autora não reforçava o comportamento do Sr. Nildo;
c) O depoimento da Sra. Larissa, em que declarou também ter sido vítima do comportamento assediador do Sr. Nildo. Ainda esclareceu que a Sra. Glau, ao julgar que uma funcionária era bonita, passava a persegui-la;
d) O depoimento do próprio Sr. Nildo, no qual reconheceu que “deu em cima” da autora e de outras funcionárias, inclusive mandou nudes para a autora, que foram momentos de fraqueza, pois tem relacionamento com outra funcionária, mas que acreditava que tudo era consentido.
Assim, as provas produzidas nos autos demonstram que é incontroverso que o Sr. Nildo enviou mensagens de cunho sexual para a reclamante, o que configura assédio sexual, principalmente porque se observa, nos referidos depoimentos, que houve repúdio da recorrida, com insistência descabida por parte do seu superior.
Não se pode afirmar que houve tolerância da reclamante diante das investidas inescrupulosas do seu superior hierárquico, eis que, diante de tal situação, a reclamante procurou evitar um desentendimento maior, procurando manter o seu emprego e sustento familiar. Mas é lógico que, nesse contexto, houve ofensa à honra da trabalhadora.
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