Deu na FOLHA: o MPF (Ministério Público Federal) no Amapá instaurou um procedimento para investigar a suspeita de exploração ilegal de madeira num assentamento agroextrativista, em área preservada da Amazônia no estado. A investigação foi aberta em outubro de 2023.
Em janeiro de 2024, a Procuradoria da República no Amapá pediu abertura de inquérito policial pela PF (Polícia Federal), com encaminhamento dos autos para a realização de diligências. A existência das investigações foi confirmada à reportagem pelo MPF, que não deu detalhes sobre diligências e sobre suspeitas investigadas. A PF no Amapá disse que não vai se manifestar a respeito das apurações em curso.
Reportagem publicada pela Folha no último dia 9 mostrou que a exploração de madeira em área do PAE (Projeto de Assentamento Agroextrativista) Maracá, em Mazagão (AP), envolve uma empresa que foi multada três vezes pelo Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis) por recebimento irregular de madeira nativa. A firma nega irregularidades.
Além disso, a anuência dada ao projeto pelo Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária) atropelou dois pareceres técnicos do órgão e dois despachos internos contrários a esse aval. Um dos pareceres aponta viés empresarial do empreendimento e suspeita de falsificação de assinaturas de beneficiários. “Apesar do alerta, houve a anuência por parte da gestão anterior da superintendência do Incra no Amapá”, afirmou o órgão do governo federal, que criou uma comissão técnica para diligência e vistoria no projeto.
O governo do Amapá, que concedeu a autorização e a divulgou em setembro de 2023, diz que o projeto é o maior do país. Envolve 172 mil hectares de floresta, quase um terço da área do assentamento, onde vivem 1.993 famílias, segundo dados do Incra. A área para a retirada de madeira, dentro de um projeto que prevê seleção das árvores a serem derrubadas e manejo sustentável da atividade, equivale a mais de mil parques Ibirapuera, em São Paulo.
O senador Davi Alcolumbre (União Brasil-AP) conduziu articulação junto ao Incra para viabilização do projeto. Já o senador Randolfe Rodrigues (sem partido-AP), líder do governo Lula (PT) no Congresso, fez divulgação da iniciativa e da atuação da empresa à frente da exploração de madeira. A retirada de madeira deveria ter caráter comunitário, mas tem viés empresarial, com intensidade máxima de corte, de 30 m’ por hectare, segundo área técnica da superintendência do Incra no Amapá.
Essa intensidade demandaria um descanso de 21 anos da área, após o prazo do projeto, que é de 14 anos, conforme análise feita por técnicos da Sema (Secretaria do Meio Ambiente) do governo do Amapá. Assim, os assentados ficariam 14 anos sem possibilidade de manejo de madeira. Pareceres técnicos da Sema também foram ignorados, e a autorização foi dada pelo governo do Amapá. Metade das famílias do assentamento recebe uma “bolsa floresta”, no valor de R$ 1.058, e não há capacitação e envolvimento da comunidade no processo de exploração de madeira, segundo os técnicos do Incra. Também não houve uma assembleia-geral para aprovação de cortes de espécies, conforme parecer. A Atexma (Associação dos Trabalhadores Agroextrativistas do Maracá) é a entidade que recebeu a autorização. Antes mesmo de receber o aval para o manejo de madeira, a associação já havia contratado empresas para exploração de madeira. Essas companhias passaram a executar o projeto.
TW Forest e a Eco Forte Bioenergia, que integram um mesmo grupo, fazem a exploração de madeira no PAE Maracá. A primeira foi multada em R$ 120,2 mil pelo Ibama quatro meses antes da concessão da autorização para o projeto. Outras duas multas somam R$ 10,1 mil e se referem a infrações cometidas dois meses depois, como consta no sistema de consulta pública do Ibama.
Em nota, TW Forest e Eco Forte afirmaram que são empresas sérias e que o projeto inibe extração ilegal de madeira, além de envolver os assentados por meio do pagamento de bolsas em dinheiro. “A comunidade local tem enviado diversos elogios e agradecimentos pelo trabalho”, cita a nota. “Em 2023, a Eco Forte Bioenergia foi à COP28 [conferência da ONU sobre mudanças climáticas], em Dubai, apresentar os resultados do projeto ao resto do mundo.” A TW Forest está no Amapá desde 2003 e tem parque industrial bem estabelecido, disse. Em 20 anos, houve apenas as multas de 2023, referentes a “falhas documentais que foram sanadas”. “A empresa jamais foi autuada por exploração ilegal de madeira. A maior das multas se deve a erro do próprio poder público, não da empresa, motivo pelo qual foi contestada.”
A Sema do Amapá afirmou que as multas aplicadas pelo Ibama ainda estavam em processo administrativo. Um relatório, após vistoria de Sema e Ibama, concluiu que inexistem irregularidades, disse o órgão do governo local, em relação à multa aplicada em abril. Alcolumbre afirmou que o Amapá deve avançar rumo ao desenvolvimento sustentável. Randolfe disse que manejo sustentável é a solução para a Amazônia.
Comentários
Postar um comentário