Em depoimento à CPI das ONGs nesta terça-feira (22), Helderli Fideliz Castro de Sá Leão Alves, presidente do Movimento Pardo-Mestiço Brasileiro e Presidente do Conselho Municipal de Direitos Humanos de Manaus, opinou que a Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) prega a “crença racista” que associa a miscigenação com a decadência cultural e denunciou ações que buscam tornar inviável a existência de mestiços em áreas classificadas como indígenas. Em sua apresentação, Helderli criticou duramente o Estatuto da Igualdade Racial por atacar o “caráter nativo” do povo mestiço brasileiro.
Quando o Estatuto define pardos como negros — acrescentou —, a norma busca “matar a identidade” dos mestiços, em violação aos termos da Convenção contra o Genocídio ratificada pelo Brasil em 1952. Ela apontou manipulação no questionário do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) no mais recente censo demográfico.
— Caso um pardo ou não-índio, vivendo em uma área considerada indígena, respondesse não ser indígena, os recenseadores foram orientados a perguntar novamente se você era indígena, ou seja, estimulando a população mestiça a virar indígena.
Segundo a depoente, além da manobra para incentivar a classificação de mestiços como indígenas, o povo mestiço estaria sendo vítima de medidas lesivas à sua economia, migração forçada, constrangimento moral e limitações de acesso a certos territórios. Ela condenou a tentativa de criação de terras indígenas onde já existe território do povo mestiço legalmente reconhecido e classificou como imprescindível a questão do marco temporal.
— [O marco temporal] vai resolver essa situação que está acontecendo não só no Amazonas, mas no país todo. O marco temporal impede que criem associações indígenas bancadas pelas ONGs. E vai dar com isso o verdadeiro valor e a valorização que os indígenas merecem, os verdadeiros indígenas, que realmente estão lá — concluiu. Para o presidente da CPI, senador Plínio Valério (PSDB-AM), as palavras de Helderli reafirmam a necessidade de enfrentamento da “caixa-preta” das ONGs. Ele disse esperar que a comissão avance nas investigações sobre entidades como o Instituto Socioambiental (ISA) e o Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam)
— Nós estamos lidando com uma organização internacional. É muito dinheiro, é muito aparelhamento. Eles trabalham de uma forma com que eles aterrorizam o nosso próprio governo. Quem discorda tem vergonha de se opor para não ser taxado disso e daquilo, porque eles se autodenominam altruístas, politicamente corretos e honestos e passam a mentir — lamentou.Nos comentários ao depoimento, a senadora Damares Alves (Republicanos-DF) manifestou sua solidariedade ao povo mestiço diante de uma situação de desrespeito à dignidade humana.
O senador Chico Rodrigues (PSB-RR) defendeu o marco temporal e opinou que “se essas ONGs fossem tão eficientes, todos os problemas que estão acontecendo hoje não teriam acontecido”. O relator do colegiado, senador Marcio Bittar (União-AC), associou a atuação das ONGs na Amazônia a más intenções de países poderosos em busca de recursos naturais.
Em votação simbólica, os membros da CPI aprovaram requerimentos de convites à secretária de Mudança do Clima do Ministério do Meio Ambiente, Ana Toni; ao ministro de Relações Exteriores, Mauro Vieira; ao presidente do BNDES, Aloizio Mercadante; e ao presidente do IBGE, Marcio Pochmann. Também serão ouvidos Deborah de Magalhães Lins, presidente do Conselho Diretor do ISA, e Benjamin Benzaquen Sicsu, presidente do Conselho Administrativo da Fundação Amazônia Sustentável, mas as convocações anteriormente aprovadas foram convertidas em convites. Por fim, a CPI solicitará informações ao Tribunal de Contas da União (TCU).
Na abertura da reunião, Plínio Valério classificou como resultado de “pegadinha” o crescimento em 90% da população indígena apurado pelo IBGE. Ele apontou o ISA como orientador do formulário do censo que teria induzido pardos e mestiços a se declararem indígenas. Marcio Bittar também questionou a interferência de uma ONG financiada com recursos internacionais na apuração de dados estratégicos do país.
— Como é que você pega uma entidade que recebe R$ 137 milhões, dos quais 80% vieram de fora, e entrega a essa entidade o direito de entrar na pesquisa do IBGE, pesquisa que serviu para ser manipulada, e dobrar a população indígena? Isso tem um objetivo: se dobra a população indígena, quer aumentar mais ainda as áreas e reservas indígenas.
Bittar anunciou que repetirá requerimento de informações ao BNDES por não se considerar satisfeito com os dados limitados fornecidos pela entidade. Conforme ressaltou, muitas informações teriam caráter sigiloso. Ele chamou atenção para vínculos entre a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, e outros membros do ministério com ONGs que recebem verbas públicas, e cobrou explicações do governo diante do “conluio” de fundações internacionais com governos estrangeiros.
— Esse movimento internacional, cujo interesse verdadeiro é uma guerra econômica, é esse movimento internacional que patrocina ONGs no Brasil, numa claríssima demonstração de quebra da soberania nacional. Quanto mais se estuda, quanto mais se aprofunda, mais fica evidente que são guerras econômicas travestidas de preocupação ambiental — avaliou.
Por sua vez, o senador Zequinha Marinho (Podemos-PA) lamentou as “barbáries” ao longo da rodovia BR-163, no oeste do Pará, onde produtores rurais ocuparam a região de boa-fé nas décadas de 1970 e 1980 e estariam perdendo suas terras para a expansão, apoiada por ONGs, de áreas de preservação.
O senador Hamilton Mourão (Republicanos-RS) também mencionou a injustiça contra os “desbravadores” daquela região, que associou a uma “estratégia indireta de dominação”.
Chico Rodrigues chamou atenção para as “gigantescas” ocorrências minerais na área dos ianomâmis e na reserva Raposa Serra do Sol, em Roraima — reservas que, segundo ele, recebem elevados investimentos de ONGs. Damares Alves pediu à CPI investigação de organizações internacionais que estariam criando obstáculos à operação do Centro Espacial de Alcântara (MA).
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