Os Irmãos Peracchi. O Rei do Mogno. O Ibama. As Empresas Certificadas e os R$ 100 Milhões em Multas



 O paranaense Idacir Peracchi chegou ao Sul do Pará em 1980 para trabalhar na extração de madeira. Investiu dinheiro na empreitada e não tardou a colher os frutos. Em poucos anos, se tornou o “rei do mogno” da cidade de Tucumã, comandando batalhões de mateiros e operadores de motosserra que ficavam no mato por até dois meses para extrair a madeira que, na época, era a mais valorizada da Amazônia. Junto com seu irmão, Idemar, fundou em 1983 a Exportadora Peracchi. 

A empresa cresceu rapidamente, às custas de crimes ambientais: ainda no final dos anos 1980, a Funai flagrou funcionários da madeireira extraindo mogno em áreas públicas griladas no meio da Terra Indígena Apyretewa, onde vivem indígenas da etnia Parakanã. Segundo o Ministério Público Federal, a Juruá devastou cerca de 5 mil hectares de floresta e construiu mais de 100 km de estradas para escoar a madeira ilegal até Tucumã.

Os irmãos Peracchi reconheceram a irregularidade e se comprometeram a recuperar a mata destruída na terra indígena — o que nunca aconteceu. Enquanto isso, fizeram uma repaginação nos negócios. No começo dos anos 1990, abriram uma nova empresa, dessa vez com roupagem ecológica: a Juruá Florestal. A madeireira virou referência no ramo. 

Em 2000, tornou-se uma das primeiras companhias desse tipo no Brasil a ser certificada pela FSC, a Forest Stewardship Council, ou Conselho de Manejo Florestal, ONG mundialmente conhecida que atesta a exploração responsável de produtos florestais. O certificado funciona como uma garantia de que a madeira da empresa não foi desmatada ilegalmente nem extraída por trabalhadores em condições degradantes. Ou assim deveria funcionar.

Ocorre que a nova empresa, mesmo certificada pela FSC, manteve o antigo padrão de infrações. Entre 2000 e 2017, a Juruá foi multada doze vezes pelo Ibama por destruir floresta sem autorização do poder público e transportar madeira sem documentação. Ao todo, as multas aplicadas nesse período somaram R$ 1,6 milhão em valores nominais. O certificado da FSC acabou servindo como um salvo-conduto para as fraudes. Enquanto cometia infrações em série, a Juruá se valia da grife FSC para informar aos seus clientes dentro e fora do Brasil que explorava madeira de forma legal e sustentável. 

Em 2004, Idacir Peracchi chegou a aparecer em um anúncio do ABN, banco holandês que operou no Brasil no começo dos anos 2000. Na peça, ele foi apresentado como exemplo de um empresário comprometido com o meio ambiente. É um caso típico do que os ambientalistas chamam de greenwashing (lavagem verde): a prática de algumas empresas e governos de se mostrarem empenhados com a causa ambiental quando, na verdade, agem no sentido oposto.

O levantamento Agência Pública, da revista piauí e do Poder 360, em parceria com o Consórcio Internacional de Jornalistas Investigativos (ICIJ) e com os projetos Data Fixers e Fiquem Sabendo, mostra que ao menos 60 empresas certificadas pelo FSC e com unidades industriais na Amazônia Legal já foram autuadas pelo Ibama. Juntas, somam mais de R$ 100 milhões em multas por todo tipo de infração: desmatamento ilegal, transporte de madeira sem documentação, fraudes em guias florestais, grilagem de terras, entre outros.

A reportagem, resultado de três meses de investigação, integra a série Deforestation Inc, do ICIJ, que reúne 39 veículos de mídia ao redor do mundo. A apuração global revelou que, desde 2004, mais de 300 empresas de produtos florestais certificadas foram acusadas de crimes ambientais e outras infrações. No caso do Brasil, os dados usados na análise consideram todas as multas registradas no sistema do Ibama até dezembro de 2022, independentemente do status atual de cobrança. O registro da multa não significa necessariamente que a empresa é culpada. Ela pode recorrer da decisão e, eventualmente, a multa pode ser anulada.

Em casos como o da Juruá, no entanto, não se trata de uma multa eventual. Há um padrão de repetidas infrações ambientais. Além de ter sido autuada por explorar madeira ilegalmente, a empresa já foi multada por fraudar o sistema de créditos do Sisflora, que monitora a comercialização de madeira em cada estado do Brasil. O sistema funciona assim: quando uma empresa obtém autorização do governo estadual para extrair determinada quantidade de madeira, a Secretaria de Meio Ambiente daquele estado insere no Sisflora o nome das espécies e a quantidade de madeira que a empresa está autorizada a extrair. 

No momento em que a madeira é vendida, o comprador recebe uma confirmação do Sisflora atestando a legalidade do produto. No entanto, há casos em que, com a conivência do poder público, madeireiras aprovam planos de manejo fictícios ou com quantidades de madeira superfaturadas. Essa sobra no saldo do Sisflora permite às empresas “esquentar” madeira retirada de áreas proibidas, como unidades de conservação e terras indígenas. Segundo o Ibama, a Juruá recorreu a esse estratagema irregular ao menos duas vezes em 2016.

Em 2011, o Ministério Público Federal cobrou da Juruá uma indenização por ter extraído 737 metros cúbicos de madeira ilegalmente — o suficiente para encher quinze caminhões com capacidade para quinze toneladas cada um. A empresa foi condenada na Justiça a pagar R$ 307 mil pelo crime. Em outro imbróglio judicial, na hora de se defender, os advogados da madeireira se agarraram ao selo da FSC, “espécie de honraria e/ou certificado conferido às empresas, dando conta da seriedade de seu trabalho na esfera florestal”, escreveram.

A FSC afirma que, quando uma empresa certificada é acusada de irregularidades, o certificado de boas práticas ambientais é suspenso ou cancelado. Mas não foi o que aconteceu com a Juruá. Ao longo de dezessete anos, a empresa renovou periodicamente seu certificado, mesmo acumulando multas do Ibama e ao menos uma condenação por crime ambiental nesse período. A Juruá só perdeu o certificado em 2017, por motivos não informados nem pela empresa nem pela FSC. Em 2022, retomou o selo. Procurada pela reportagem, a Juruá afirmou, por meio de nota, que não recebeu multas ambientais desde a última certificação da FSC, ano passado. Ressaltou, além disso, que “nenhuma empresa deve sofrer discriminação por ter sido autuada por órgãos de fiscalização antes do término do processo recursal”.

A FSC é uma organização multinacional sem fins lucrativos fundada em 1993 e sediada em Bonn, na Alemanha. Os selos emitidos por ela atestam que a madeira e outros produtos florestais comercializados por uma determinada empresa têm origem sustentável e são produzidos de forma a minimizar impactos socioambientais. É um selo de bom comportamento ambiental, uma chancela ecológica. Essa certificação é muito visada por empresas em todo o mundo porque lhes permite cobrar mais por seus produtos e abre as portas para mercados exigentes – como os da Europa – que, cada vez mais, querem se ver livres de produtos associados ao desmatamento e outros crimes ambientais. 

Além disso, o selo facilita a captação de investimentos externos e melhora a imagem das companhias junto à opinião pública. Existem seis tipos de certificado FSC, mas os mais relevantes são dois: o de manejo florestal, fornecido para determinada área explorada comercialmente por uma empresa, e o de cadeia de custódia, que analisa e valida todas as etapas da manufatura da madeira, do corte até a venda final, de uma determinada empresa. No Brasil, os selos FSC são emitidos por onze empresas certificadoras, a um custo que varia conforme o tamanho da indústria e das áreas exploradas.

A partir da última década, a FSC, formada por centenas de ONGs ambientais, madeireiras e sindicatos pelo mundo, passou a sofrer fortes críticas, sobretudo por parte de entidades ligadas à defesa do meio ambiente, que a acusam de leniência na concessão dos certificados a infratores ambientais contumazes. 

“Identificamos falta de consistência em vários certificados deles, inclusive no Brasil”, diz Daniel Brindis, porta-voz para o tema de florestas do Greenpeace. 

“Infelizmente a FSC faz vista grossa para muitas empresas, porque depende do setor privado e é muito pressionada pelas madeireiras.”

Em 2018, o Greenpeace encerrou sua parceria de longa data com a FSC acusando a entidade de falta de transparência e rigor na certificação de empresas. As informações sobre as empresas certificadas usadas nesta reportagem foram coletadas em uma plataforma online da FSC. O site, contudo, permite apenas a visualização dos dados, não a extração, o que, na prática, impede que seja analisado todo o universo de empresas certificadas (estima-se que, no mundo, sejam dezenas de milhares). 

A reportagem solicitou acesso aos dados repetidas vezes, mas a FSC se recusou a fornecê-los. Na última resposta, alegou que “leis de privacidade” dificultariam o compartilhamento das informações.

Entre as madeireiras certificadas pela FSC que acumulam multas, a Alecrim Indústria de Madeiras é um caso peculiar: a empresa não apenas foi autuada dezenas de vezes, como seus donos, os gaúchos Aldir Schmitt e Milton Schnorr, cumpriram pena em regime semiaberto em Santarém (PA), condenados por crimes ambientais. Ser preso no Brasil por esse tipo de delito é extremamente raro, já que as penas costumam ser pequenas. Além disso, é necessário que o réu seja reincidente — caso de ambos — para que um juiz possa mandá-lo à prisão. Os dois sócios foram presos em 2019. Mas, mesmo assim, a empresa não perdeu o selo da FSC, emitido em 2015. Fundada por Schnorr em 1994, a Alecrim foi autuada 31 vezes entre 1997 e 2021. 

As multas somam 3,1 milhões de reais em valores nominais. Ao menos seis delas foram emitidas depois de a empresa obter o selo FSC. As infrações são diversas: venda de madeira sem licença adequada, exploração de madeira em terra indígena sem autorização e armazenamento irregular de madeira. Quase todas foram registradas no Pará. Muitas já foram pagas, mas algumas ainda se encontram em processo de julgamento no Ibama. Há dezenas de registros de exportação de madeira feitos pela Alecrim desde 2020. A lista de compradores inclui países como Estados Unidos, Panamá, Colômbia, Espanha, França e Reino Unido.

Os donos da Alecrim aparecem no quadro societário de duas outras empresas do mesmo ramo. Uma delas — a Algimi Florestal — acumula oito multas e já foi condenada na Justiça por poluir um igarapé. A despeito das condenações, Aldir Schmitt constava, até abril de 2022, como vice-presidente da Associação das Indústrias Madeireiras de Santarém (Asimas). 

Recentemente, a Asimas anunciou uma parceria com o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) “em busca de estratégias sustentáveis para a colheita florestal”. Procurada pela reportagem, a Alecrim enviou uma nota alegando que “os autos de infração [do Ibama] são controversos e passíveis de nulidades, emitidos, ao nosso ver, por equívoco ou interpretação equivocada do agente autuador”. Quanto à prisão dos dois sócios da empresa, a nota diz que “foi injusta e arbitrária, ainda assim já cumprida, não devendo os pretendidos autores nada à Justiça”.

Assim como a Juruá Florestal e a Alecrim, a Pampa se vende como uma empresa sustentável. Fundada em 1987 pelo empresário gaúcho Demorvan Tomedi, a madeireira é um caso de sucesso. Prosperou com a exportação de madeiras e acumula hoje um capital social de R$ 34 milhões, um parque industrial de 100 mil m2 e um porto privado no Pará. Mas, assim como as outras empresas, acumula infrações ambientais. Foi multada doze vezes pelo Ibama, sendo quatro delas depois de ter obtido seu certificado FSC, em 2012. As multas recebidas pela Pampa somam R$ 5,1 milhões, em valores nominais. A maioria dos casos é por fraudes no Sisflora: segundo os agentes do Ibama, a empresa “esquentou” madeira retirada ilegalmente de áreas próximas à Rodovia Transamazônica.

As reiteradas multas renderam à Pampa processos na Justiça Federal. Em uma delas, a empresa foi condenada em duas instâncias a pagar R$ 962 mil por danos morais e ambientais e recuperar 195 hectares de mata nativa. Em outra ação, Tomedi, dono da Pampa, foi condenado por falsidade ideológica por inserir créditos de madeira fictícios no Sisflora. Tempos depois, o empresário deixou o comando da empresa. 

As condenações ocorreram quando a madeireira já era certificada pela FSC. Por meio de nota, a Pampa afirmou que todas as autuações do Ibama, bem como as condenações judiciais, estão em fase de recurso, e que a empresa “foi certificada e se mantém certificada porque cumpre o padrão” da FSC. Outro caso semelhante é o da Madeireira Rancho da Cabocla. Sediada em Santarém, a empresa acumula 49 multas do Ibama. Ao menos catorze delas foram registradas depois que a madeireira obteve o selo da FSC, em 2018. 

Um dos sócios da empresa, Moacir Ciesca, foi preso numa operação da Polícia Federal, em 2004, acusado de corromper funcionários do Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária) para invadir terras públicas no sudoeste do Pará. Ciesca responde, ainda hoje, a um processo por contrabando de madeira.

Por meio de nota, a Rancho da Cabocla alegou que todas as multas que recebeu quando já tinha o certificado FSC tratam de questões puramente administrativas — ou seja, infrações menos graves, que não prejudicam o meio ambiente. É verdade: desde 2018, a empresa foi multada por transportar madeira de forma irregular e preencher informações falsas no Sisflora. Segundo o Ibama, porém, o transporte irregular de madeira e o uso de dados falsos frequentemente são adotados por madeireiras para disfarçar madeira de origem ilegal. 

Na nota, a Rancho da Cabocla insinuou que está em curso uma tentativa de criminalização da atividade madeireira. Sem citar nomes, a empresa afirmou que “interesses internacionais não confessáveis e escusos tentam marginalizar a atividade madeireira no sentido de auferirem vantagens pessoais e de grupos que não vivem aqui, não temos outra explicação”.

Uma das primeiras empresas brasileiras a conquistar a certificação FSC para o manejo florestal sustentável foi a Mil Madeiras Preciosas. Fundada em 1994 em Itacoatiara (AM), a empresa é uma filial da Precious Woods, multinacional do setor madeireiro com sede na Suíça, e está entre as maiores exportadoras de madeira do Brasil. A empresa obteve o certificado da FSC em 1997 e, desde então, renovou a credencial várias vezes, apesar das dezenas de multas ambientais que recebeu desde então. Juntas, as autuações passam dos R$ 7 milhões. A Mil Madeiras foi acusada pelo Ibama de destruir áreas de floresta sem autorização, apresentar informações enganosas referentes ao seu plano de manejo e abrir uma estrada no meio da floresta sem a anuência das autoridades. 

Uma das multas mais onerosas foi aplicada em 2002, quando fiscais do Ibama flagraram o transporte irregular de 24 mil m3 de toras de abiurana, castanharana e outras espécies de árvores — uma quantidade enorme, capaz de encher 480 caminhões. A Mil Madeiras Preciosas recorreu da decisão, e o caso segue em aberto até hoje. Atualizado com juros e correção monetária, o valor da multa passava de R$ 26 milhões em setembro de 2021. (Na mesma ocasião, a empresa também foi multada por transportar uma leva de toras sem autorização – mas, nesse caso, a multa foi anistiada por decisão do Ministério do Meio Ambiente, em 2006.)

A Mil Madeiras Preciosas afirmou, por meio de nota, que nunca teve seu certificado FSC suspenso ou cancelado, medida prevista em casos de irregularidades. Para a empresa, não há contradição entre as multas e o certificado de boas práticas, uma vez que o auto de infração “não representa, por si só, a condenação”. 

Além disso, diz a nota, as multas são controversas, já que “muitos órgãos ambientais interpretam a legislação brasileira para aplicar penalidades para meras irregularidades administrativas, como, por exemplo, o equívoco no preenchimento da guia de transporte de produto florestal”. Quando as multas foram aplicadas contra a Mil Madeiras Preciosas em 2002, o Imaflora — certificadora vinculada à FSC — saiu em defesa da madeireira. Divulgou uma nota afirmando que as autuações eram “questionáveis”, e que as infrações apontadas pelo Ibama “não colocaram em risco o manejo florestal e/ou o controle de origem da matéria prima”. As multas “não faziam o menor sentido”, disse o engenheiro florestal Tasso Azevedo, que é membro da câmara econômica do FSC e na época coordenava o núcleo amazônico do Imaflora. “Não é que a empresa explorou madeira onde não devia”, afirmou. “Não houve problema ambiental algum, é um problema de documentação.”

Para Azevedo, as autuações recebidas pela Mil Madeiras Preciosas e por outras empresas certificadas não põem em xeque a validade do selo FSC. Ele argumentou que, para manter a certificação, elas passam por monitoramentos anuais nos quais são obrigadas a informar as multas que receberam. “Toda vez que se faz uma auditoria, a empresa tem que declarar tudo o que tem de passivos e quais procedimentos está tomando para resolvê-los. Ela deve se justificar e informar o que vai fazer para que isso não se repita”, explica o engenheiro. 

Na avaliação de Azevedo, o fato de que eventuais infrações sejam tratadas nessas auditorias é um sinal de que o sistema funciona. “Qualquer empresa tem infrações, e tem que evitar que elas se repitam, mas a ideia de que isso seja um problema sistêmico das empresas certificadas é uma falácia”, disse Azevedo. O engenheiro florestal lembrou que as regras para a obtenção do selo FSC são rígidas. 

“As empresas certificadas têm o acampamento certinho e funcionários registrados, com equipamentos de segurança, que vão a campo com o plano de manejo para extrair o mínimo de cada árvore — e cada uma delas tem uma etiqueta com o número rastreado. É outro universo.” Na avaliação de Azevedo, as maiores ameaças ao meio ambiente vêm das madeireiras que não oferecem qualquer garantia de boas práticas. “Não tem como comparar isso com as atividades baseadas na ilegalidade.”

De acordo com o gerente de certificação do Imaflora, Ricardo Cardoso, as certificadoras fazem monitoramentos anuais para verificar se as empresas continuam em conformidade com seus princípios. Casos de suspensão temporária acontecem com alguma frequência, mas a perda definitiva da certificação é rara, explicou. O próprio Imaflora, no entanto, reconhece que o sistema de certificação não é perfeito. 

“Atores locais ou partes interessadas não devem ter a expectativa de que uma empresa certificada FSC não tem — ou nunca teve — problemas socioambientais”, afirmou a certificadora, por meio de nota. “A certificação FSC e as empresas florestais certificadas não substituem o papel de governos locais e estaduais na regulação das atividades privadas ou na promoção de desenvolvimento socioeconômico.” Ao ICIJ, FSC disse desconhecer situação das empresas certificadas no Brasil.

O ICIJ perguntou à FSC se o certificado de boas práticas ambientais ainda tem algum propósito, já que várias empresas cometeram infrações e não perderam o selo. Na resposta, a entidade alegou que, só nos últimos cinco anos, 88 empresas tiveram seus certificados suspensos devido a infrações ambientais. (A FSC não informa o total de empresas certificadas no mundo, mas é possível afirmar que são milhares: a ONG diz ter emitido 53 mil certificados de cadeia de custódia, que validam as etapas da manufatura da madeira.) Os mecanismos de controle, segundo a entidade, vêm se tornando mais rígidos nos últimos anos. 

“A FSC está guiando novas tecnologias para a identificação de madeira, de forma que sua proveniência possa ser cientificamente atestada”, diz a nota. “A FSC também está desenvolvendo uma ferramenta baseada no blockchain para monitorar dados em tempo real sobre transações que acontecem entre diferentes detentoras de certificados.” 

Questionada sobre o uso do certificado para a prática de greenwashing, a entidade afirmou apenas que o selo de boas práticas ajuda no combate ao desmatamento e à degradação ambiental. “Nossas exigências garantem que as empresas de manejo florestal certificadas mantenham ou aumentem a estrutura, função, biodiversidade e produtividade de suas florestas.” A FSC afirmou que suas políticas também garantem que os direitos de trabalhadores e comunidades indígenas sejam respeitados. Mas ressaltou: “A FSC não alega que pode resolver sozinha problemas de múltiplas camadas como o desmatamento e reconhece a necessidade de que muitos atores e stakeholders se envolvam com essa empreitada.” 

No caso específico do Brasil, o ICIJ perguntou à FSC como é possível que empresas certificadas acumulem tantas multas, mas a entidade disse que não estava informada sobre o assunto: “Não estamos cientes dessas investigações pelo Ibama que podem ou não ser relevantes para as atividades cobertas por nossos padrões”, afirmou a entidade. A FSC alegou ainda que suas normas e procedimentos poderão ser atualizados para que se adequem melhor à realidade brasileira.

Esta reportagem faz parte do especial #DeforestationInc, que investiga as falhas da indústria de madeira certificada na Amazônia e no mundo. O #DeforestationInc é uma investigação transnacional coordenada pelo ICIJ (International Consortium of Investigative Journalists ou Consórcio Internacional de Jornalistas Investigativos, em Português) e contou com 39 veículos parceiros ao redor do planeta. No Brasil, além da Agência Pública, a revista Piauí e o Poder360 participaram da investigação.

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