O Ouro Ilegal. A Defensoria da União. A Lei de 2013. A Ação de Inconstitucionalidade



 A Defensoria Pública da União (DPU) pediu para ingressar na ação direta de inconstitucionalidade, que questiona trecho de lei, de 2013, que pode ter facilitado o comércio ilegal de ouro. O mesmo pedido foi apresentado ao Supremo Tribunal Federal (STF) pela WWF-Brasil, Instituto Socioambiental e o Instituto Alana. A ação direta de inconstitucionalidade (ADI), foi ingressada inicialmente pelo Partido Verde, em 31 de janeiro deste ano, pouco após o governo federal iniciar diversas medidas emergenciais ao povo Yanomami. O garimpo ilegal de ouro na região é apontado como o principal causador da crise sanitária e humanitária vivida pelos indígenas, por conta da poluição do rio por mercúrio, desmatamento e assédio.

A ADI questiona trecho da Lei Federal n.º 12.844/2013, que permite às distribuidoras de títulos e valores mobiliários (DTVMs), autorizadas pelo Banco Central, a comprarem ouro com base no “princípio da boa-fé”. Ou seja, basta somente a palavra do vendedor sobre a origem do minério. Desta forma, o ouro de origem ilegal entra no mercado formal com facilidade. Um estudo do Instituto Escolhas aponta que o garimpo ilegal começou a crescer após a sanção da lei, especialmente a partir de 2015. Dados do Mapbiomas, iniciativa do Sistema de Estimativas de Emissões de Gases de Efeito Estufa do Observatório do Clima, mostram crescimento da mineração de ouro em Roraima a partir do mesmo ano.

Questionado pelo STF na ação, o Banco Central informou que estuda, com outros órgãos públicos, um novo sistema para rastrear a rota do ouro, ou seja, desde a extração em áreas de garimpo. No documento, a DPU e as demais instituições explicam que a legislação brasileira estabelece que a exploração de ouro depende de prévia autorização do Poder Público, mas que os títulos não são suficientes para se atestar a legalidade da atividade produtiva. “Além dessas autorizações, também será necessário obter licenças ambientais, entre outros requisitos”, apontam. A exploração do metal pode ocorrer de três formas:

Permissão de lavra garimpeira (quando o ouro é explorado em atividade garimpeira); Concessão de lavra (em operações industriais que dependem de pesquisa prévia e incluem o beneficiamento do minério) ou; Guia de utilização (de modo excepcionalíssimo, ainda na etapa de pesquisa e antes da outorga da concessão de lavra).

“De todo modo, qualquer atividade de extração de ouro que não conte com ao menos um desses títulos autorizativos outorgados pela ANM [Agência Nacional de Mineração] pode ser prontamente qualificada como ilegal”, diz parte do texto. 

Em outro ponto, as instituições ressaltam um problema que atingiu níveis de guerra na terra indígena Yanomami nos últimos meses: a contaminação de pessoas e do meio ambiente em razão do garimpo ilegal. A garimpagem está diretamente associada ao uso do mercúrio, substância com alto potencial contaminante. Todo o ouro extraído da terra indígena é realizado de forma irregular, já que não há autorização para tanto. Índices altos de contaminação por mercúrio foram encontrados em peixes no trecho do rio Branco, em Boa Vista. O nível identificado foi de 25,5%. 

As porcentagem são ainda maiores no Baixo Rio Branco (45%), rio Mucajaí (53%) e rio Uraricoera (57%). Os dados fazem parte de um estudo da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), do Instituto Socioambiental (ISA), do Instituto Evandro Chagas e da Universidade Federal de Roraima (UFRR).

As instituições explicam que a não adoção das medidas necessárias para fazer cessar o garimpo ilegal, especialmente em terras indígenas e em áreas protegidas, reforça a posição do Estado brasileiro de não cumprir decisões internacionais nesse sentido. Por outro lado, a ação que está em análise pelo STF, tem o condão de tornar a legislação nacional “menos permissiva ao ouro extraído ilegalmente, com severas repercussões à vida, à saúde e à segurança dos povos indígenas e comunidades tradicionais”.

“O garimpo ilegal, fomentando pela permissividade da legislação ora impugnada, impede a presença do Estado na terra indígena, por resultar em ameaças e ataques também a servidores públicos da área da saúde. Portanto, para além dos efeitos diretos de precarização da saúde dos povos afetados pelo garimpo, a atividade repercute, igualmente, em serviços estatais de acesso à saúde, vulnerando-os”,conclui o texto.

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