Veja só essa assustadora do “elevador do medo”, parte da história do Palacete Bibi Costa, situado no centro da capital paraense. Apesar do fluxo intenso na avenida Governador José Malcher, em Belém, é difícil não notar outro ator em cena. Alto, rosado e laranja, com pontas agudas que remetem a um castelo e janelas e portas vistosas, o Palacete Bibi Costa faz parar todo o barulho da rua para quem tira um segundo para admirá-lo. Ainda mais quando o transeunte conhece sua fama de mau.
Encomendado em 1904 pelo Major Brício Costa e sua esposa, Anna Macdowell, projetado pelo arquiteto Francisco Bolonha, o prédio foi inaugurado em 1906 e já, de cara, recebeu como hóspede o então presidente Afonso Pena.
Até então, tratava-se apenas de uma bela obra eclética que celebrava a “belle époque” amazônica abastecida com o dinheiro do ciclo da borracha. Mas a casa foi a leilão com a morte de Costa em 1909 e teve como segundo dono o seringueiro José Júlio de Andrade, que fez fortuna no interior do Pará.Mesmo com a escravidão abolida, relatos apontam que Andrade mantinha pessoas aprisionadas em suas terras. Ganharam força nessa época os boatos sobre escravizados trabalhando no palacete, embora nada disso tenha sido provado.
Quando o seringalista deixou Belém em 1952, o Bibi Costa foi vendido para o comerciante Lauro Ramos e, 15 anos depois, repassado para o Departamento Nacional de Portos e Vias Navegáveis. A essa altura, as assombrações no local já eram famosas por não deixarem os funcionários públicos em paz.
A história de um deles é conhecida: ele teria o nome de Augusto e, num dia de serão extra, ouviu vozes o chamando no porão. Ao chegar para ver, deu de cara com um homem negro, acorrentado e com o rosto machucado. “Me tira daqui! Não aguento mais sofrer”, suplicava. Augusto saiu correndo, pediu transferência do trabalho e nunca mais voltou. Mas esse era apenas o começo.
Elevador do medo
Alugado em 1987 para a Secretaria de Estado de Planejamento, o Bibi Costa “matou” três titulares consecutivos da pasta. O primeiro, Amilcar Tupiassu, foi convidado para assumir o cargo em 1989 pelo então governador Hélio Gueiros. Toda vez que ouvia um relato estranho de algum funcionário, ele buscava uma explicação lógica para acalmar o ambiente. Mas o elevador com porta pantográfica o tirava do prumo. Mais de uma vez, Tupiassu viu o elevador funcionando sozinho.
Às vezes, o secretário deixava o elevador aberto para que ele não se movimentasse. Mas não adiantava. Foi quando ele decidiu lacrar o elevador e desligar a máquina. Poucas semanas depois, Tupiassu foi encontrado morto na sala de casa, vítima de um ataque cardíaco.
Ainda com o elevador lacrado, o então secretário-adjunto de Tupiassu precisou assumir o posto, mas morreu logo depois, enquanto caminhava pela Praça da República, em Belém. Outra secretária-adjunta assumiu o posto e manteve o elevador lacrado.
Quando ela morreu, no início de 1990, a cidade inteira ficou em choque e determinou que a sucessão de mortes não devia ser uma mera coincidência.Com dificuldades de conseguir um novo secretário de planejamento após diversas recusas, o governador teria ordenado que o elevador voltasse a funcionar. As mortes, então, cessaram.
Pote de sal grosso
Para o sobrinho de Tupiassu, o advogado Fernando Sampaio, 44, as histórias posteriores impactaram a família tanto quanto a própria morte do tio. “Meu tio era um senhor de idade, obviamente. Tinha problemas cardíacos. Mas minha avó, que era muito cética e lúcida, acreditava nas coisas misteriosas dessa estranha coincidência. Ela relatava como se tivesse sido uma ação executada pela própria casa”, conta.
Já no fim dos anos 1990, o Palacete Bibi Costa tornou-se a sede da Administração das Hidrovias da Amazônia Oriental, logo após a construção de um prédio anexo. Nessa virada, ele passa a responder à Superintendência do Patrimônio da União. Andreza Vieira, 43, se apaixonou pelo Bibi quando chegou para trabalhar lá como revisora de textos, em 1998, a convite de um professor dela.
Segundo ela, quase todos os funcionários tinham algum objeto religioso nas salas, mesas ou gavetas.”Meu professor tinha um pote imenso de sal grosso, pimenta, alho. Eu brincava perguntando se ele ia caçar vampiros. A bibliotecária, quando dava um determinado horário, acendia um incenso. Tinha um clima de medo quando ia dando cinco ou seis da tarde. Ninguém ficava lá, desligavam tudo. Na época, eu achava que era para economizar energia por causa dos apagões no Brasil”, conta. Um dia, durante uma festa junina, ela lidava com cartas. O ar-condicionado ligou e desligou em questão de segundos e todos disseram se tratar de assombração, visagem. Andreza não deu bola.
Mas, durante uma chuva forte, Andreza precisou passar do horário. A ventania a fez fechar as janelas e ela não percebeu o avançar da noite. Foi quando ouviu passos em direção à sala onde estava. “Ele abriu algumas portas e saiu correndo, rindo. Achei que era meu professor. Me levantei e, quando fui atrás, o Bibi Costa estava vazio”, relata. Minutos depois, a mesma cena, mas dessa vez o controle remoto do ar-condicionado começou a girar e o aparelho foi desligado. “Saí correndo descalça e deixei até minha bolsa lá. Só deu tempo de pegar meu celular. Mas fui empurrada na escada, não sei por quem. Caí, cheguei sem voz no prédio anexo e fui acudida pelo guarda”, afirma ela.
Meses depois, ela começou a sonhar constantemente com o palacete pegando fogo. E, em 2001, um grande incêndio tomou conta do local. Foi quando Andreza pediu demissão.’Isso não é normal. Hoje, ela lamenta ver o palacete abandonado.
“Sonho em ver tudo reformado. Sempre achei que lá deveria funcionar um museu. A sociedade merece”, conta ela, que não sabe até hoje se acredita 100% nas assombrações do local. O engenheiro Osvaldo Boulhosa, 50, também trabalhou no local e é cheio de lembranças.
Em uma delas, um servidor estava dormindo em um quarto do prédio anexo e ouviu uma mão batendo na porta. Quando foi atendê-la, não viu ninguém. Ele então ficou de pé segurando a maçaneta e esperou baterem de novo. Quando abriu a porta, o resultado foi o mesmo. “Ele saiu só de cueca correndo e foi parar na rua. Voltou acompanhado pelo guarda”, relembra. Boulhosa nunca viveu uma “experiência paranormal” lá, como define. “Já fiquei diversas vezes até tarde com amigos trabalhando sem nenhuma ocorrência.”
O vigilante Luís Carlos Monteiro, 65, trabalhou no local no início da década de 1990 e acredita que as almas que teriam sofrido lá nunca encontraram paz. Os amigos o chamavam de corajoso. “Não era questão de coragem. Eu trabalhava do lado de fora, na entrada. Mesmo assim, uma vez, juro: escutei um grito forte de socorro. Foi tão real. E aí teve os secretários morrendo. As pessoas morrem todo dia, claro, mas isso não é normal, né? Talvez tenha sido melhor sairmos de lá”, reflete.
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