A Rádio Clube do Pará. Os Barbalhos. O Ministério das Comunicações. O Cancelamento da Concessão


 Não é por acaso que o governador do Pará, Helder Barbalho, está com “sangue nos olhos” em relação ao presidente da República, Jair Bolsonaro. O Ministro das Comunicações, Fábio Faria, acatando decisão da Justiça Federal no processo administrativo n.º 53115.005827/2022-01 cancelou, no dia 12 de setembro último, as concessões outorgadas a Rádio Clube do Pará, de propriedade da família Barbalho, para executar o serviço de radiodifusão sonora em onda média e tropical, ambas no município de Belém. A portaria foi assinada no dia 12 de setembro, porém só foi publicada no Diário Oficial da União no último dia 07 de outubro.

Em março deste ano, o desembargador federal Prudente de Moraes já havia rejeitado apelação de Jader e Elcione Barbalho, requerendo efeito suspensivo da decisão judicial. 

“O pedido de concessão de efeito suspensivo ao recurso de apelação interposto pelos recorrentes Jader Fontenelle Barbalho e Outros esbarra na decisão por mim proferida, em sede de agravo de instrumento (AI nº 0012093-34.2017.4.01.0000/PA), em que deferi o pedido de antecipação da tutela recursal formulado pelo Ministério Público Federal, para determinar a imediata suspensão da execução do serviço de radiodifusão sonora da requerida Rádio Clube do Pará PRC-5 Ltda., devendo a União Federal se abster de conceder-lhe novas outorgas de serviço de radiodifusão, afinando-se, assim, com a sentença monocrática” . Pontuou Prudente de Moraes, ao indeferir o pedido de apelação.

O cancelamento definitivo da concessão acontece quatro anos depois da Justiça Federal determinar que o governo brasileiro faça novo processo seletivo para outorga da concessão à outra pessoa jurídica que não tenha impedimentos legais para serviços de radiodifusão. A sentença, da 2ª Vara Federal de Justiça em Belém, atende a pedido do Ministério Público Federal (MPF), em processo iniciado em 2016.

O processo do MPF se baseia no artigo 54 da Constituição brasileira, que veda a políticos detentores de mandato a propriedade de veículos de comunicação. Segundo o artigo, deputados e senadores não podem celebrar ou manter contratos com concessionárias de serviço público, o que inclui as emissoras de rádio e TV.

O inciso II, a, do mesmo artigo veda aos parlamentares serem proprietários, controladores ou diretores de empresas que recebam da União benefícios previstos em lei. A regra também impede a participação de congressistas em prestadoras de radiodifusão, visto que tais concessionárias possuem isenção fiscal concedida pela legislação.

Na defesa apresentada à Justiça, Jader Barbalho e Elcione Zaluth Barbalho informaram que se desligaram do quadro societário da empresa que possui a concessão da Rádio Clube do Pará em 2017 (após a ação judicial do MPF). Em lugar deles, passou a figurar no quadro societário Giovana Centeno Barbalho, filha de Jader, a quem ele passou a representar na empresa, na qualidade de procurador.

Para a Justiça, a mudança no quadro societário, após o ajuizamento da ação, tornou a situação jurídica da concessão ainda mais irregular. “Merece especial destaque que as cotas sociais de Elcione Barbalho foram transferidas para seus dois filhos (também filhos de Jader Barbalho), demonstrando a permanência do controle familiar sobre a pessoa jurídica. Mais grave, porém, é a situação do senador da República, que, além de ceder suas cotas para a filha, continua exercendo ingerência direta sobre a empresa concessionária, como seu representante”. Diz a sentença da juíza federal Mariana Garcia Cunha.

A investigação sobre a propriedade de emissoras de rádio e tevê por políticos foi iniciada pelo MPF em São Paulo, que fez um levantamento em todo o país das concessões de radiodifusão que tinham políticos como sócios. A partir disso, várias ações foram iniciadas em vários estados do país. Já existem decisões judiciais em tribunais superiores retirando as concessões das mãos de parlamentares, seguindo o entendimento do Supremo Tribunal Federal, que já se manifestou contrário ao controle de políticos sobre veículos de comunicação.

Outras ações – Em 2016 o MPF ajuizou cinco ações contra concessões de radiodifusão em território paraense que têm como sócios detentores de mandatos eleitorais, com base no artigo 54 da Constituição Federal. Os deputados federais Elcione Barbalho (PMDB/PA) e Cabuçu Borges (PMDB/AP) e o senador Jader Barbalho (PMDB/PA) violam a legislação ao figurarem no quadro societário de rádios e uma emissora de televisão. “O fato de ocupante de cargo eletivo ser sócio de pessoa jurídica que explora radiodifusão constitui afronta à Constituição Federal”, diz o MPF nos processos judiciais iniciados em Belém pela Procuradoria Regional dos Direitos do Cidadão.

Foram pedidos o cancelamento das concessões de radiodifusão ligadas aos políticos, a condenação da União para que faça nova licitação para tais concessões e a proibição de que eles recebam qualquer outorga futura para explorar serviços de radiodifusão. 

As emissoras que tiveram as concessões questionadas foram a Beija-Flor Radiodifusão, do deputado Cabuçu Borges, a Rede Brasil Amazônia de Televisão, o Sistema Clube do Pará de Comunicação, a Carajás FM, a Belém Radiodifusão e a Rádio Clube do Pará – PRC-5, todas de propriedade de Elcione Barbalho e Jader Barbalho.

História

Fundada por Roberto Camelier, Eriberto Pio e Edgar Proença, a transmissão inaugural da Rádio Clube ocorreu em 22 de abril de 1928,cinco anos depois da primeira rádio brasileira, a Rádio Sociedade do Rio de Janeiro, sendo a Clube a primeira emissora de rádio do Pará e da região Norte do Brasil. 

Como as primeiras rádios do Brasil, a emissora surgiu na forma de uma associação, em que os integrantes pagavam mensalidades fixas para manter a emissora. A publicidade nas rádios somente seria regulamentada em 1932. Discos eram emprestados por comerciantes locais que, por sua vez, recebiam divulgação de seus locutores. As transmissões ao vivo eram noturnas, e contavam com cantores, instrumentistas e poetas da cidade.

Em seu apogeu, passou a ser conhecida como “A Poderosa”, trazendo a Belém artistas consagrados como Carmen Miranda, Silvio Caldas, Dalva de Oliveira, Carlos Galhardo e Orlando Silva. Seu declínio começou com a chegada da televisão ao Pará, a concorrência com a Rádio Marajoara e, nos anos 70, das primeiras FMs do estado. 

O prefixo pertenceu a família Proença até 1983, quando Adolpho Bloch comprou a Clube, dois meses depois de inaugurar a Rede Manchete. Em 1993, foi adquirida pelo Grupo RBA de Comunicação, da família Barbalho. 

Comentários